Tudo começou com um sonho
da adolescência. Filho de agricultores, nascido em Barra de Guabiraba, no
Agreste pernambucano, especificamente na localidade de Sítio Novo, José Gilmar
da Silva transpunha as barreiras de sua condição financeira e alimentava o desejo
de ser advogado.
Hoje, o Doutor Gilmar é
juiz de direito da capital e desembargador substituto, com atuação na área
cível. Dono de uma história de dedicação, esforço e superação que é exemplo
para muitas pessoas.
A família da qual nasceu
era pequena: pai, mãe e três crianças — dois meninos e uma menina. A filha do
casal do sítio morreu aos 12 anos, vítima de poliomielite infecciosa. As
dificuldades eram presentes, “Vivia morando em casa de taipa, de chão batido,
dormindo em rede, numa situação muito precária”, conta.
Quando completou 12 anos,
o adolescente Gilmar começou a trabalhar no corte da cana-de-açúcar. “Além de
cortar cana, eu trabalhava na roça em casa, todo o serviço de agricultura eu
fazia desde criança”, explicou. Trabalhou no corte da cana até os 18 anos.
Devido à infância privada
de benefícios e oportunidades, estudar não foi possível. Entretanto, sendo um
autodidata, o Ir. Gilmar aprendeu a ler aos 6 anos, com uma cartilha do ABC e
depois lendo revistas que conseguia com um vizinho.
Aos 14 anos, duas coisas
começaram a mudar em sua história. Em primeiro lugar, a oportunidade de
conhecer o Evangelho. “Em 1980, uma irmã chamada Corina trabalhou ao meu lado
espalhando cana. Ela contou a história de Jonas para mim e fez o convite para
que eu aceitasse Jesus”, narra. Através dele, seus pais se converteram a
Cristo. Em segundo lugar, veio a oportunidade de estudar. “A esposa do meu
primo, a Mirian, me disse: ‘Gilmar, você já está com 14 anos, você precisa
fazer seu curso. Eu gostaria que você entrasse na quarta série’”, revelou.
Apesar de não ter as três séries anteriores, o Doutor Gilmar foi um dos
melhores alunos daquela turma e ganhou o boletim de conclusão do antigo Ensino
Fundamental I.
Para continuar estudando,
ele precisava de alguém que o acolhesse na cidade. O Sítio Novo estava distante
6 quilômetros do centro de Barra de Guabiraba, e sem transporte era impossível
voltar pra casa após as aulas. “Minha mãe foi falar com um amigo da família. A
família dele era numerosa, mas ele disse que, se era para que eu pudesse
estudar, o que ele tivesse para os seus filhos seria para mim também. Hoje, eu
louvo a Deus por ter usado essa pessoa para me ajudar e a considero como um
alicerce”, explica.
Assim, durante os próximos
4 anos, a rotina do adolescente Gilmar foi: trabalhar no corte de cana até as 3
horas da tarde, correr para casa e arrumar-se, ir para a estrada esperar carona
até a cidade, dormir na casa do amigo de seus pais e voltar, em um pau de
arara, para o trabalho pela manhã bem cedo. “É o que eu chamo de enfrentar
dificuldades, enfrentar barreiras, e não esmorecer diante de tamanhas
dificuldades financeiras”, declarou o Ir. Gilmar, ao falar do sustento familiar
que era exclusivamente daquilo que se cultivava.
Enquanto estudava o antigo
Ginásio, hoje Ensino Fundamental II, o Doutor Gilmar conheceu a inspiração para
o sonho de fazer Direito. “Eu me espelhava em uma professora de Português, a
Ézia. Eu a chamava de ‘a gramática ambulante’, porque ela sabia tudo sobre
português, e eu a admirava demais, principalmente por ela ser advogada.” Mas
aquele desejo era praticamente impossível. “O meu sonho era ser advogado. Como,
eu não sabia”, disse.
Terminando o Fundamental
II, aos 18 anos, o Doutor Gilmar foi orientado a ingressar nas Forças Armadas.
“Vim ao Recife e ingressei no exército [...] fiz o curso de cabo e fiquei em
primeiro lugar numa turma de 86 pessoas [...] No ano seguinte, eu fiz o
supletivo porque observava que estava em desvantagem em relação aos meus
companheiros que já tinham o Ensino Médio, e alguns até cursavam faculdade.”
Por ter sido o primeiro colocado no curso, o Ir. Gilmar seria
promovido e mandado embora. Como não tinha onde ficar no Recife e não queria
voltar para o interior, pediu para não ser promovido no primeiro ano. Mas a promoção
acabou não acontecendo no segundo ano, e ele ganhou uma licença sem ter pedido.
“Eles tinham muito ódio porque eu arregimentava muitos soldados para assistir a
um culto. Na época, eu fazia o que a Sarah, hoje, faz”, afirmou, referindo-se
ao Intervalo Bíblico, que oADNews apresentou na editoria Jovem da edição de janeiro de 2014.
Tendo que deixar as Forças
Armadas, o Doutor Gilmar iniciou uma verdadeira peregrinação. “Eu dormia na
casa de um, na casa de outro, procurando emprego, e as portas fechadas.” Além
disso, ele perdeu a mãe aos 19 anos. Havia ficado desolado.
Enquanto estava nessa
situação, foi acolhido pela família da Ir. Adélia, de Brasília Teimosa, onde
ficou cultuando. Conseguiu, através de um amigo, um emprego de vigilante em Boa
Viagem. Ficou ali por 3 meses. “Eu passava a noite inteira trabalhando e
estudando [...] havia comprado umas apostilas enquanto ainda estava no exército
[...] queria fazer vestibular e já havia me inscrito [...] Naquela época era o
vestibular unificado através da Covest, eram a Rural, Federal e Católica, mas
para Direto havia apenas as duas últimas opções.”
Pediu demissão porque iria
fazer as provas do vestibular que, na época, duravam 5 dias. “Eu tinha uma
esperança de que poderia passar no vestibular, então pensei: ‘Vou ficar
desempregado, vou colocar para segunda entrada, Deus vai abrir uma porta nesse
interregno, e eu vou poder pagar a faculdade, se não ficar na Federal’”,
contou.
No entanto, calculando que
não conseguiria chegar a tempo ao local das provas — que foram realizadas no
prédio de Economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) — saindo de
Brasília Teimosa, foi à procura da Ir. Elvira, dos Torrões, que era mãe de um
amigo que conhecera no Exército.
No primeiro dia de prova,
no caminho, com o filho da Ir. Elvira, encontraram uma irmã estendendo roupa.
Ele gritou: “Irmã, ore por esse moço que ele vai fazer o vestibular”. A irmã
respondeu: “Não preciso orar porque ele já passou”, relembrou emocionado.
Saiu o resultado. Foi
classificado para o curso pago, mas não tinha condições de pagá-lo. Nesse
ínterim, a Ir. Elvira o chamou para morar com sua família. Foi a sua segunda
mãe. Só deixou aquela casa quando se casou, em 1991. “Foi uma promessa de Deus!
Ele havia me dito que iria providenciar uma mãe para mim”, contou, enfatizando
que a Ir. Elvira o tratou como um filho.
Enquanto aguardava o mês
de agosto, quando entrou na universidade, conseguiu um emprego em uma loja do
centro do Recife. Quando as aulas começaram, surgiu um impasse no emprego. O
horário do curso era pela manhã. Chegou a ter o trabalho ameaçado, mas, como
Deus lhe havia falado, o gerente o procurou depois de uma semana de aula para
comunicar a decisão de que ele poderia estudar pela manhã e trabalhar à tarde
sem nenhuma redução de salário.
Sempre em busca de suas
metas, o Doutor Gilmar não parou de se esforçar e estudar. Primeiro, conseguiu
aprovação em bolsas que a universidade concedia. Depois, passou no concurso da
Metrorec, onde trabalhou por 7 anos e 2 meses.
Nesse intervalo conheceu a
esposa. Aos 26 anos, concluiu o curso de Direito e se casou. Sua avidez por
conhecimento o levou ao topo na Metrorec. “Eu fui subindo de nível [...] não
havia mais como ser promovido [...] Então, um dia, enquanto trabalhava, uma
jovem do Jiquiá passou perto de mim e disse: “Deus vai triplicar o teu
salário”, contou, lembrando que afirmou que cria naquela palavra, mas em sua
mente sabia que isso não podia acontecer naquele emprego.
“Foi quando saiu o edital
para o concurso do Tribunal Regional Federal [...] havia 33 vagas para técnico
e apenas 1 para oficial de justiça avaliador, que hoje é de analista”, explicou
o Doutor Gilmar. Ele decidiu se inscrever para a vaga de oficial. “Muitos
advogados perguntavam se eu estava louco, porque só havia uma vaga, e eu dizia
que era a minha”.
O concurso foi bastante
concorrido, ao todo 35 mil pessoas se inscreveram. Depois de muito estudo e
dedicação, chegaram a prova e o resultado. Dos 210 candidatos aprovados para o
cargo de oficial, o Doutor Gilmar foi o quinto. “Todavia, na mesma semana que
saiu o resultado, o Tribunal Regional Federal liberou mais cinco vagas. Com uma
que já havia, foram seis. Eu era o quinto e entrei na primeira turma. A
matemática de Deus é diferente da nossa”, glorificou. “Aí se cumpriu a promessa,
o primeiro salário que eu recebi foi três vezes maior do que o da Metrorec”,
pontuou.
Continuando em busca dos
sonhos e sempre se dedicando aos estudos, o Doutor Gilmar decidiu ingressar na
Escola Superior de Magistratura, pretendendo prestar concurso para o cargo de
juiz. Em 1997, ele ingressou na magistratura. A primeira comarca em que
trabalhou foi no município de Ibirajuba, depois passou por Aliança e, em
seguida, São Lourenço da Mata. Nas três localidades, cumpriu-se um sonho que
ele tivera. “Eu havia sonhado com militares de estrela que prestavam
continência a mim, mas eu não era nem queria voltar a ser militar, e me
perguntava como aquilo iria acontecer. E o Senhor cumpriu a promessa em três
ocasiões”, afirmou.
Depois da graduação em
Direito, o Doutor Gilmar também cursou Administração e fez pós-graduação em
Direito Público. Além disso, teve a oportunidade de fazer cursos no exterior,
em universidades dos Estados Unidos, do Canadá, de Portugal e da Argentina. E
ainda tem projetos de cursar mestrado e doutorado.
As lágrimas que em um e
outro momento inundaram os olhos durante a conversa, segundo ele, têm gosto de
resultado. “O choro hoje é um choro de emoção, de alegria por aquilo que Deus
fez na minha vida”, sorriu.
Ciente de que a sua
história tem sido fonte de inspiração para muitos, ele não esquece o dia em que
esteve realizando a cerimônia civil de um casamento coletivo, em Macaparana,
Agreste de Pernambuco, e notou que um senhor o olhava com grande admiração. “Pensei:
‘Deve ser pela maneira que utilizo a Palavra de Deus em um casamento civil,
pela maneira que me preocupo com o ambiente, colocando um fundo musical’”,
disse. Entretanto, em um culto de Santa Ceia, no Templo Central, reconheceu,
entre os ministros, um conhecido do interior, era o mesmo senhor que o olhava
naquele casamento. “Fui falar com ele, e ele perguntou se eu era filho do seu
Zé Galego — forma como meu pai era chamado — e se eu era juiz, e se havia feito
um casamento em Macaparana, respondi que sim. Foi quando ele disse: ‘Eu cheguei
em casa e disse à minha esposa que aquele juiz era o filho de seu Zé Galego,
mas ela disse: ‘Não pode ser, ele era cortador de cana, como é que ele pode
estar ali como juiz?’ [...] Aí, pra mim, isso é muito forte, porque Deus faz o
impossível acontecer’”, concluiu com lágrimas.
Em dezembro de 2013, saiu
a publicação que informava a seleção do Doutor Gilmar para compor o grupo dos
desembargadores substitutos. “Eu encaro isso como atuação de Deus, foi uma
surpresa, mas não muda em nada a minha pessoa, continuo sendo o Ir. Gilmar”,
completou o juiz de direito da capital, que também é diácono da IEADPE.
Encerrando este texto,
cujo título foi escolhido pelo seu entrevistado, trazemos as palavras do Doutor
Gilmar sobre sua atividade na magistratura. “Eu não tenho dúvida de que é a
atuação de Deus na minha vida [...] eu consideraria como um ministério mesmo
[...] Deus tem se utilizado de cada momento; muitos divórcios deixaram de
acontecer porque Deus se utilizou da ferramenta que eu tinha nas mãos [...]
casos difíceis de serem resolvidos, e Ele me orientou [...] posso dizer que
tenho dormido tranquilo porque o que eu fiz foi fazer justiça”.
Fonte:ADNews
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